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O PORTAL DA MEMÓRIA VIGIENSE




A Biblioteca dos Jesuítas na Vigia - por Serafim Soares Leite





AS BIBLIOTECAS DOS JESUÍTAS NO PARÁ: UMA VISÃO A PARTIR DA OBRA DE SERAFIM LEITE (Casa-colégio da Vigia) Por Ailson dos Santos Cardoso
Mais um tesouro máximo da Vigia foi descoberto por acadêmicos de mestrado e doutorado das mais distantes academias universitárias deste imenso Brasil, seja de onde vier, o importante é que a história é verdadeira que nos faz viajar no imaginário literário vigilengo, imaginar os padres jesuítas debruçados nos livros em silêncio em um ritual religioso canônico. Tudo isso foi possível descobrir graças a um escritor e pesquisador da Companhia de Jesus no Brasil. Serafim Soares Leite, padre jesuíta, poeta, escritor e historiador português que viveu muitos anos no Brasil, primeiro na adolescência e, posteriormente na idade madura, como pesquisador da atuação dos padres da Companhia de Jesus, catequizadores e educadores em terras brasileiras a partir do século XVI. Serafim Leite nasceu em 6 de abril de 1890, São João da Madeira, Portugal, Faleceu em 27 de dezembro de 1969, Roma, Itália. Livros: História da Companhia de Jesus no Brasil: 1549-1760. Sua primeira edição foi publicada em 1938.
A COMPANHIA DE JESUS.
A Companhia de Jesus, ordem fundada por Inácio de Loiola em 1539, chegou ao Brasil dez anos mais tarde. Essa data, 1549, marca o início da vida administrativa, política, militar, espiritual e social no país. Acompanhando o então governador-geral Tomé de Sousa, o pequeno grupo de religiosos liderado pelo padre Manuel da Nóbrega tinha como missão catequizar e alfabetizar os índios e colonos, nas chamadas “aulas de ler, escrever e contar”. Para isso, construíram colégios, residências e seminários. Os colégios, que somavam 19 em meados do século XVIII, eram verdadeiros centros culturais que promoviam atividades envolvendo música, teatro e literatura.
FORMAÇÃO DAS BIBLIOTECAS.
De acordo com Luiz Fernando Medeiros Rodrigues em sua tese: As “livrarias” dos Jesuítas no Brasil colonial, segundo os documentos do Archivum romano societatis iesu, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, uma das principais preocupações desde a instalação dos primeiros missionários jesuítas no Brasil foi providenciar os meios necessários para o desempenho das suas atividades missionárias. Entre estes estavam os livros. Constituíam a base para a ação dos jesuítas, e a sua falta prejudicava as atividades da ordem na catequese dos índios, assistência religiosa, ensino e educação dos colonos. E assim procuravam instalar bibliotecas em todos os seus estabelecimentos, desde os mais importantes, situados nas sedes das províncias, até os mais modestos nas distantes aldeias. Referindo-se às casas no norte do Brasil, Serafim Leite afirma: "Não havia aldeia, por mais recuada que fosse na profundeza dos sertões e rios, que a não iluminasse ao menos uma estante de livros" (2004, t. IV, p. 113). A formação das bibliotecas se dava pela doação e aquisição de volumes. As doações eram iniciativas também de particulares. Já as compras só ocorreram quando os colégios já estavam estabelecidos e obtinham lucro. Por exemplo, os colégios do Maranhão e do Pará vendiam os remédios de suas boticas (farmácia) para a população rica e determinaram que parte da renda fosse convertida em livros. A biblioteca do Colégio da Vigia mantinha estantes, continham um local próprio para a colocação de etiquetas que indicavam os assuntos.
A CRIAÇÃO DOS ACERVOS LIVROS TRAZIDOS PELOS PADRES.
Os primeiros livros foram trazidos pelos próprios jesuítas em sua bagagem. O núcleo do Colégio da Bahia, a mais importante de todas as bibliotecas e iniciada em 1549, foram os livros trazidos por Nóbrega.
OS BIBLIOTECÁRIOS
A biblioteca estava sob a supervisão de um religioso, que exercia o papel de bibliotecário. Além da própria biblioteca, estavam sob a sua responsabilidade também outros religiosos, encarregados do funcionamento diário e da limpeza. Contudo, Serafim Leite só encontrou nove religiosos que trabalharam nas livrarias: um no século XVII e os demais no século XVIII. As denominações para os primeiros bibliotecários eram muitas: conservador da biblioteca (bibliothecae custos), prefeito da biblioteca (bibliothecae praefectus), bibliotecário (bibliothecarius), dentre outras.
AS BIBLIOTECAS
No Pará, após o estabelecimento em 1653 dos jesuítas em Belém, foram iniciadas as obras do Colégio de Santo Alexandre, que passaram por várias etapas. Outras fundações no Pará também possuíam livros. A Casa-Colégio de Vigia, que começou entre 1732 e 1735, dispunha de uma biblioteca com 1.010 volumes. Foram conservados apenas os catálogos da biblioteca do Rio de Janeiro e da biblioteca da Vigia que se encontra publicado na íntegra (LEITE, 2004, t. IV p. 160-167). A Residência da fazenda de Ibirajuba possuía pequena biblioteca. Entre os livros, havia a Crônica do Brasil, de Simão de Vasconcelos. O Seminário de Nossa Senhora das Missões dispunha de "alguns centenares" de livros.
O CONTEÚDO DAS BIBLIOTECAS
Serafim Leite considera que os acervos das bibliotecas jesuíticas eram de boa qualidade e quantidade, conforme as observações que fez acerca de algumas delas. A biblioteca do Colégio do Rio de Janeiro reunia "milhares de obras“, O Colégio do Recife, o do Espírito Santo, a da Bahia. São conhecidos, até o presente, os catálogos de duas bibliotecas no Brasil: a do colégio de Vigia, no Pará, e a do Rio de Janeiro. Ambos foram feitos durante o inventário dos bens da Companhia após a expulsão dos jesuítas. Leite acredita que todas foram inventariadas no momento do sequestro, mas perderam-se quase todos os inventários, ou ignora-se ainda o seu paradeiro. O catálogo da casa de Vigia registra 1.010 volumes "que se achavam [na casa] quando o padre Caetano Xavier, então superior, foi preso". Predominam livros de cunho religioso nos campos de teologia, direito, moral, ascética, escriturística, apologética, liturgia e filosofia. No sermoniário, registra-se obras da oratória sacra da época. Aparecem obras poéticas de Homero em grego e em latim, obras de Virgílio, Horácio, Marcial, Ovídio, Terêncio e Cícero. A história e a geografia estavam representadas com diversas obras. A engenharia, medicina e matemática se faziam presentes com alguns títulos. De autores portugueses como Camões e Vieira, encontravam-se as obras completas. A livraria, "imersa como um foco de luz nas selvas coloniais do Brasil possuía um pouco de tudo", conclui Leite (LEITE, 2004, t. IV, p. 167). Abaixo foto da sala de leitura do Colégio dos Jesuítas, hoje transformada em museu em Salvador – BA. Imaginamos que a biblioteca da Vigia seguia a mesma arquitetura exibindo sua beleza.


Sala do museu colégio dos jesuítas em Salvador - BA - fonte: //bibliomania-divercidades.blogspot.com.br

Colégio da Mãe de Deus da Vigia (óleo sobre tela de Antônio Coutinho)

ACERVO ENCONTRADO NA BIBLIOTECA DA VIGIA.
Serafim Leite lista as principais obras que estavam presentes na biblioteca de Vigia cerca de 1.010 obras, tais como: Homero (com os seus dois poemas), os poetas latinos Virgílio, Horácio, Marcial, Ovídio e Terêncio; e Cícero com todas as obras, Séneca e Suetónio. Mencionam-se a celebérrima Arte do Pe. Manuel Álvares, a Arte da Língua Brasílica de Luís Figueira, a Nova Floresta de Manuel Bernardes, a Arte de Orar de Diogo Monteiro, os Trabalhos de Jesus de Frei Tomé de Jesus, obra-prima da mística portuguesa. No copioso sermonário, para só falar dos estrangeiros, Bourdaloue, Ségneri e S. Francisco de Sales. Na história e biografia, entre outros, Berredo (história local), as Crónicas dos primeiros reis portugueses, a História Romana, a História da América e uma surpreendente Respublica Moscovítica. Obras de teologia, sagrada escritura, ascética, exercícios espirituais de Santo Inácio, direito canónico e um escolhido lote de direito civil português, com a última edição das Ordenações do Reino. Livros de medicina, matemática, astronomia, atlas, geografia, e já o Extracto do Diário e Viagem do Sr. Condamine, talvez oferta do mesmo sábio La Condamine, que, durante a medição dos graus do meridiano debaixo do equador, foi hóspede reconhecido dos Jesuítas do GrãoPará. [...] os dois > da língua pátria, com as suas obras completas, Camões e Vieira. Segundo Tainá Guimarães Paschoal da Universidade Estadual de Campinas, cita em sua tese que o jesuíta João Daniel, pode ter tido acesso a esses autores na própria biblioteca do Colégio da Vigia, viveu no Pará de 1741 a 1757, pois cita no seu Manuscrito: TESOURO DESCOBERTO NO MÁXIMO RIO AMAZONAS. Nesse manuscrito o padre descreve a região da Vigia. João Daniel escreveu o manuscrito na prisão em Portugal de 1757 a 1776.
OS DESTINOS DOS LIVROS
As bibliotecas do Pará totalizavam cerca de 4.000 volumes no momento da expulsão dos padres jesuítas. Em 1760, foi decidido que as duplicatas existentes nesse total deveriam ser remetidas para Lisboa para venda. O restante seria reunido para constituir o fundo da biblioteca pública da cidade. Tal não aconteceu e os livros permaneceram no Colégio. Posteriormente, os livros dos Colégios de Santo Alexandre e da Vigia, por Carta Régia de 11 de junho de 1761, foram doados a um Colégio de Nobres, que nunca chegou a funcionar. Por volta desse mesmo período, parte do acervo foi remetida para Portugal. Dom João de São José e Queirós, beneditino e quarto bispo do Pará no período de 1760 a 1763, enviaram "dez caixões com os ricos livros dos jesuítas aos seus confrades de Lisboa". Por fim, a Carta Régia de 11 de junho de 1790 determinou que o Colégio de Santo Alexandre e seus bens fossem destinados à Mitra. Serafim Leite informa que, durante sua pesquisa de livros pertencentes aos jesuítas no Brasil em bibliotecas de Portugal (biblioteca pública de Évora), localizou alguns livros do Colégio do Pará. Cita a obra Arte da Língua Brasílica de autoria de Luiz Figueira (registrado no catálogo do acervo da biblioteca de Vigia), com a notação Col° do Pará. Afirmava tratar-se do único exemplar da primeira edição de 1621. Borba de Moraes, contudo, na sua Bibliographia brasiliana, informa a existência de dois exemplares conhecidos. Um pertencente à Biblioteca Nacional de Lisboa, com a indicação de propriedade do Colégio do Pará, e outro, à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Uma busca no sítio da Biblioteca Nacional de Lisboa www.bn.pt¹, confirma a existência da obra e informa que a mesma pertencia à Companhia de Jesus no Pará, respectivamente a biblioteca de Vigia. Foi certamente o exemplar visto por Serafim Leite.



A vida de Luís Figueira foi primeira estudada pelo historiador Serafim Leite, que publicou sua biografia e seus escritos em 1940. Nascido em Almodôvar, no Alentejo - Portugal, em data imprecisa (1574 ou 1576), Figueira entrou como noviço jesuíta no Colégio do Espírito Santo de Évora em 22 de janeiro de 1592, onde cursou Humanidades, Filosofia e Teologia. Ordenado padre, veio para o Brasil em 1602. Instalou-se no Colégio Jesuíta da Bahia, localizado em Salvador. Segundo o cronista Jacinto de Carvalho, Figueira aprendeu a "língua dos índios" com o padre Francisco Pinto, que conheceu no Colégio de Salvador. Pouco tempos depois de sua chegada, foi escolhido para redigir a "Carta Bienal da Província", relativa aos anos de 1602 e 1603, um relatório enviado à sede da Companhia de Jesus em Roma, o que demonstra que suas qualidades literárias foram reconhecidas por seus superiores. Foi autor de uma das primeiras gramáticas da língua tupi, a partir do contato com potiguares, tupinambás, tabajaras e caetés, denominada “Arte da Lingua Brasilica”, impressa pela primeira vez em 1621 em exemplar único que pertenceu a biblioteca dos jesuítas na cidade de Vigia estado do Pará, hoje se encontra na biblioteca de Évora em Portugal. Capa da 1ª edição do livro. Que pertenceu a biblioteca da Vigia, hoje se encontra na biblioteca de Évora em Portugal.
CONCLUSÃO
Por Luiz Antônio Gonçalves da Silva Doutor em ciência da informação pela Universidade Complutense de Madrid, Espanha; Tecnologista do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia. O Brasil contou, durante cerca de duzentos anos, com um considerável acervo de livros, à disposição de interessados, nas livrarias jesuíticas. As informações contidas na obra de Serafim Leite, embora dando destaque às mais importantes, oferecem uma visão de como poderia ter sido o seu funcionamento em todo o país. A Companhia de Jesus tinha as suas ações orientadas pelo método intitulado Ratio Studiorium, que determinava procedimentos uniformes em todos os colégios da ordem, inclusive quanto a livros, bibliotecas e práticas de leitura. O desmantelamento dos acervos, ocorrido após a saída dos jesuítas, privou o país de um importante patrimônio cultural. Torna-se necessário que se conheça melhor a história desse período e o destino de tantos livros, como subsídio para a história das idéias e da formação do conhecimento no Brasil.
REFERÊNCIAS.
Leite, Serafim Soares, História da Companhia de Jesus no Brasil, 2004.
Paschoal, Tainá Guimarães, 1990 - Descobrindo os "tesouros" do jesuíta João Daniel: a mandioca e seu projeto para a Amazônia colonial. (Dissertação de mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.
Rodrigues, Luiz Fernando Medeiros, (Dissertação de doutorado) As “Livrarias” dos jesuítas no Brasil colonial. Segundo os documentos do Archivum Romanum Societatis Iesu. Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Rio Grande do Sul.
Silva, Luiz Antônio Gonçalves da, (artigo) As bibliotecas dos jesuítas: uma visão a partir da obra de Serafim Leite, 2008. www.scielo.br Thalles Carvalho, Brasil, História das Bibliotecas: www.frontispicio.wordpress.com. https://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_Figueira Estudo dos autores citados.
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